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Preservar é preciso

Por Cidades e Serviços
Última atualização: 29/05/2024

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Preservar é a nova ordem mundial e uma escolha sem volta. Mas essa premissa não está presente somente nos temas relacionados ao meio ambiente, que ganham cada vez mais visibilidade, sobretudo em meio às ondas de calor e o inequívoco aquecimento global. Preservar também a cultura, a memória, a história são decisões que a humanidade já entendeu que precisa tomar. E por que não fazer valer esse sentido tão importante no mercado imobiliário? Mais do que uma tendência, conservar, recuperar e restaurar construções antigas, sejam elas tombadas ou preservadas pelo patrimônio histórico para, a partir delas, erguer novos empreendimentos passou a ser uma necessidade e uma tendência. Com a escassez de terrenos nas áreas mais disputadas do Rio de Janeiro tornou-se fundamental olhar para esse tipo de bem e criar projetos que possam ressignificar esses locais e trazer experiências inovadoras para os futuros moradores. Ao mesmo tempo que se preserva a história contida em cada tijolo desses imóveis antigos.

 

Para muitos pode parecer inicialmente um grande entrave. Para mim, que atuo no setor há mais de 20 anos e sempre estive imersa nesse mercado, enxergo como uma grande oportunidade. E não estou sozinha. Não à toa, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) recentemente anunciou que deve destinar R$ 1,3 bilhão do Ministério da Cultura para lançamento de um Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) específico para obras de recuperação de mais de 100 prédios históricos no país. O Rio de Janeiro deve ser contemplado com 7 projetos. O mesmo Iphan se inspirou no “Adote um Casarão”, do Governo do Maranhão, por meio de Parcerias Público-Privadas, para ajudar a dar a edifícios tombados novos usos.

 

Criar um projeto unindo o antigo e o moderno, sempre buscando entender e respeitar a história do local e seu entorno e valorizando e ressignificando o que essa construção já viveu, é também uma maneira de devolver à cidade sua memória arquitetônica, criando e deixando um legado de imenso valor a partir de um novo capítulo que está sendo criado naquele endereço. Esse movimento de revitalização imobiliária tão necessário e que muito me orgulha já está acontecendo, porém ainda pontualmente. Por isso, é preciso expandir e o papel da iniciativa privada é fundamental.

 

Em todo o Rio de Janeiro existem diversos imóveis tombados que estão abandonados e em ruínas e que poderiam virar grandes projetos a partir de incentivos do poder público. Casarões onde moraram Portinari, Machado de Assis e Monteiro Lobato, por exemplo, sofrem com a má conservação, ainda que tenham sido alvo de decretos de tombamento, que não estão sendo cumpridos. Em geral, por falta de recursos para isso. Levantamento recente da Subprefeitura do Centro do Rio apontou que a apenas na região existem cerca de 160 imóveis abandonados ou em péssimo estado de conservação. No mês passado, a Prefeitura publicou um decreto determinando que imóveis em estado de abandono serão considerados vagos e ficarão 3 anos em propriedade municipal. Por outro lado, dados públicos divulgados pela imprensa mostram que há no Rio de Janeiro mais de 12 mil imóveis em nome da Prefeitura, do Estado, da União e até do antigo Distrito Federal (quando o Rio era capital do Brasil), boa parte deles abandonada ou invadida. Ou seja, só o setor público não dá conta do que precisa ser feito.

 

Ao nos depararmos com esse tipo de patrimônio, nossa maior preocupação tem que ser sempre revitalizar o imóvel ou terreno, oferecendo, ao mesmo tempo, um novo uso, seja na forma de uma área comum para os novos moradores do empreendimento ou até mesmo como áreas privativas cheias de charme e modernidade.

 

Nessas situações, não é raro tocarmos em sentimentos profundos dos futuros proprietários, trazendo à tona memórias afetivas sobre aquela rua, aquele bairro e seus moradores. Sentimentos que, muitas vezes, fazem parte da história de vida do cliente e que ele quer reviver e oferecer essa mesma experiência à sua família. E isso vai bem além de morar em um imóvel que ofereça o custo x benefício adequado; é uma experiência sensorial que une passado e presente.

 

Há vários exemplos de projetos bem sucedidos neste sentido, como o do Largo do Boticário, o do Hotel Glória, o da Clínica Pitanguy, em Botafogo. E acho importante destacar outros dois, ainda em execução. Na Rua Professor Gabizo, na Tijuca, além do casarão tombado e abandonado onde morou Monteiro Lobato, há no número 243 uma outra casa tombada que está sendo preservada para um projeto residencial, assinado pelo arquiteto Sérgio Conde Caldas. O Casa Gabizo, mescla arquitetura contemporânea com a clássica. A área comum será instalada na casa tombada, proporcionando uma atmosfera de viver em uma casa, algo raro nos dias de hoje. O que seria desse patrimônio sem o investimento privado?

 

No início de 2023 o prefeito Eduardo Paes aceitou o apelo da sociedade e tombou o casarão onde funcionava até 2022 o Colégio Padre Antônio Vieira, no Humaitá, por mais de 80 anos. Mas o bem ficaria sem destinação, escondido atrás da construção que dava espaço à escola, se não fosse também pela iniciativa privada. Agora o casarão será restaurado e a ideia é que se possa ser visto da rua, mantendo viva a memória do local e trazendo ainda mais beleza para a região, um bairro tradicional em casarios antigos. Para este projeto, até a escolha do escritório de arquitetura foi pensada focando no afeto. O escritório dos premiados arquitetos Celso Rayol e Fernando Costa, assina o projeto de restauro. Celso é pai de ex-aluno do colégio e trouxe diversas referências que serão aplicadas.

 

Para as incorporadoras, equacionar esse processo é mais complexo e mais caro do que erguer um empreendimento do zero. Mas, de modo geral, vale a pena. Não é o bem tombado que dificulta ou facilita as vendas e, sim, o projeto desenvolvido a partir desse bem. Quando partimos da premissa que o coração do projeto é o bem tombado, tende-se a se revelar um projeto coeso, dando a devida importância ao preservado. Assim chegamos aos clientes com algo encantador.

Nesse processo, é sempre possível resgatar e observar elementos arquitetônicos que marcam o tempo da construção, o resgate de um ladrilho que estava por baixo de um piso que foi colocado posteriormente, a fundação em pedra que denota uma técnica construtiva específica de um período. Esses elementos vão nos ajudando a montar esse quebra-cabeça que conta a história da construção e de um determinado período. Para mim, esse trabalho é um serviço quase arqueológico, que ajuda a contar a história de uma parte da cidade, de um bairro, de uma época. E, principalmente, das pessoas que ali viveram.

 

Por: Tanit Galdeano, médica, empresária e presidente da TAO Empreendimentos

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