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Inclusão é lei! E agora… Regulamentada

Por Cidades e Serviços
Última atualização: 13/10/2020

cadeirante
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Mario Camelo

 

Em dia 26 de julho de 2018 foi assinado um decreto que regulamenta o artigo 58, da Lei Brasileira de Inclusão (Lei nº 13.146 de 2015), mais conhecida como Estatuto da Pessoa com Deficiência, que determina a eliminação de barreiras, entraves e obstáculos arquitetônicos em edifícios públicos e privados. O decreto dispõe de normas e medidas que deverão ser seguidas por incorporadoras e construtoras brasileiras a partir de 26 de janeiro de 2020, com requisitos para (quase) todos os projetos de novas edificações.

 

De acordo com o texto, as empresas da Construção Civil passarão a projetar e a construir empreendimentos de edificação de uso privado multifamiliar com unidades adaptáveis. Assim, as unidades adaptáveis poderão ser convertidas em unidades internamente acessíveis, ou seja, que estejam de acordo a receber pessoas com deficiências, se isso for solicitado pelo comprador por escrito até o início das obras do empreendimento. E tudo isso sem cobrança de valores adicionais para a conversão, já prevista em Lei. O decreto regulamentado foi escrito pelo Ministério dos Direitos Humanos em parceria entidades do setor imobiliário.

 

Na época da assinatura, o então ministro dos Direitos Humanos, Gustavo Rocha, disse em entrevista ao jornal Correio Braziliense que “com a medida, concluiu-se a regulamentação completa da Lei Brasileira de Inclusão em menos de um ano”. A LBI havia sido aprovada em 2015 e, desde então, não havia sido regulamentada.

 

No decreto também é estabelecido que 100% das unidades já devem ser projetadas prevendo a possibilidade de adaptação interna posterior. Isso significa que elas devem possuir características construtivas que permitam, a partir de alterações de layout, dimensões internas ou quantidade de ambientes, a adaptação para uma unidade internamente acessível, sem que sejam afetadas a estrutura da edificação e as instalações prediais.

 

À frente da Organização Nacional das Entidades de Deficientes Físicos (Onedef) e integrante da Associação Nacional dos Deficientes Físicos (Andef), Carmen Fogaça participou ativamente da elaboração da LBI e da regulamentação do decreto, pois também é conselheira do Conselho Nacional da Pessoa com Deficiência, o CONADE.

 

“O que é mais importante de tudo isso é a gente poder trabalhar essa questão de tornar acessível não somente as entradas e áreas comuns dos prédios, mas também os apartamentos. E essa regulamentação não vai beneficiar somente a pessoa com deficiência, mas sim uma população muito grande, que são os idosos. Nós focamos muito na questão do deficiente, mas nos esquecemos que a população brasileira está envelhecendo cada vez mais. Essa parcela também vai se beneficiar da Lei, assim como todos que possuem mobilidade reduzida”.

 

Segundo uma pesquisa do IBGE, um em cada quatro brasileiros será idoso em 2060. E em 2039, o número de pessoas acima de 65 anos superará o número de pessoas com até 14 anos, por exemplo.

 

Carmem explica que existem diversos recursos de acessibilidade como altura do interruptor, aparelhos sonoros e luminosos e que tudo isso está bem amarrado na nova regulamentação.

 

“Foi a própria necessidade. Dentro da Lei, existem vários artigos que estão sendo regulamentados e aos poucos isso vai surgindo. O que foi bom também é que houve uma discussão com o Conselho Nacional, houve uma discussão com a sociedade civil… Muita gente participou dessa decisão”, diz ela, que usa muletas, e já usou cadeira de rodas. Na época, se deparou com um mundo no qual ela “não cabia”, pois a maioria dos ambientes, especialmente as moradias, não possui larguras e recuos ideais para um cadeirante.

 

Sobre a implementação, Carmen chama a atenção para outro ponto: “O decreto fala em unidades adaptáveis e unidades de adaptação razoável… Ou seja, em regras variáveis que possam se adequar a diversos tipos de imóveis. Isso para o proprietário do imóvel é um avanço e acredito que, para as construtoras, não vai ser nada fora do comum, nada oneroso. Hoje, você já vê a adaptação razoável acontecer de diversas formas. E é exatamente isso que a Lei traz: proporcionar a acessibilidade sem custo alto para as empresas da Construção Civil”, opina.

 

Carmem lembra ainda que a Lei foi criada há pouco tempo, em 2015, e que barreiras são difíceis em todos os aspectos. Para ela, à medida que as implementações começarem a acontecer, irão surgir também novas necessidades, regulamentações e adaptações.

 

E só quem sente na pele é que pode dizer o valor dessas mudanças. Cadeirante há 12 anos, Renata Cazale teve que fazer diversas adaptações por conta própria no apartamento onde vive em Niterói para poder ter uma vida mais confortável e circular livremente na própria casa.

 

“As construções antigas não tinham essa visão. De uns tempos pra cá, ainda conseguimos ver muitas portarias com seus elevadores adaptados e isso facilita bastante. Mas na estrutura interna do apartamento, ter essa opção com acesso à varanda, ao banheiro, é essencial. A área da dispensa, por exemplo, nos fundos, é totalmente imprópria para quem usa cadeira de rodas. Quando eu mudei, tive que fazer reforma, adaptar tudo, mas não pude mexer na estrutura. Consegui abrir a porta do banheiro, colocar uma porta de correr, mexi na área de serviço, na divisão da cozinha para área, quebrei pedaços de parede… E sai caro, não é barato! Ainda por cima quando você tem um imóvel antigo, que precisa achar os mesmos azulejos, cor de tinta etc”.

 

Renata comemora a nova regulamentação. “É uma mudança lenta, foram quatro anos só para regulamentar, mas está acontecendo. As pessoas estão olhando para isso. No meu prédio, por exemplo, a síndica fez uma obra na rampa de acesso. Ela era inclinada, mas não na medida correta. Isso também é um auxílio para os idosos, por exemplo”, diz ela, que completa: “Eu me tornei cadeirante há 12 anos. É um outro universo. Felizmente moro em Niterói, uma cidade que dá atenção a isso, mas na verdade, o mundo não é feito para quem tem dificuldade de se locomover. Eu deixo de fazer muitos passeios, de ir a muitos lugares, porque sei que não estão preparados. Fico triste, mas é bom ver as mudanças acontecendo”.

 

Outras regras descritas

Há algumas exceções previstas no Decreto. Algumas tipologias de unidade ficam dispensadas da obrigação das adaptações para acessibilidade, como as unidades de um dormitório e, no máximo, 35 metros quadrados, além dos apartamentos com dois dormitórios e área útil de até 41 metros quadrados.

 

Além disso, também não são abrangidos pela lei edificações de programas habitacionais públicos ou subsidiados, objetos do artigo 32 da Lei Brasileira de Inclusão, que prevê às pessoas com deficiência prioridade na aquisição de imóveis desses programas e direito a ocupar pelo menos 3% das unidades habitacionais.

 

Também serão disponíveis para escolha dos compradores: puxador horizontal na porta do banheiro, barras de apoio no box e bacia sanitária, torneiras com acionamento por alavanca ou sensor, fita contrastante para sinalização de degraus e registros, bancadas, lavatórios, quadro de energia, interruptores e tomadas com altura adequada a pessoas com nanismo. Hoje, essas adaptações não são obrigatórias, e, além de caras, ficam por conta do comprador.

 

Há ainda uma disposição que cita os empreendimentos que adotarem sistema construtivo que não permita alterações posteriores, tais como alvenaria estrutural, paredes de concreto, impressão 3D ou equivalentes. Vale a regra de que 3% do total de apartamentos já seja projetado com as características da unidade acessível, independentemente de haver demanda de compra.

 

Há ainda informações sobre as vagas de garagem, que são maiores para deficientes físicos. O texto prevê que, pelo menos 2% das vagas sejam para deficientes físicos ou pessoas com baixa mobilidade.

 

As unidades acessíveis terão ainda:

– Na sala e nos quartos: área de manobra para cadeira de rodas com amplitude mínima de 180 graus, além de de área de transferência para passar da cadeira para a cama em pelo menos um dormitório e na sala;

 

– Nos banheiros: área de manobra com amplitude mínima de 180 graus, aproximação frontal ao lavatório, modalidade de transferência ao vaso sanitário, dimensões mínimas do box para chuveiro de acordo com as necessidades previstas, reforço nas paredes para instalação de barras de apoio e banco articulado em pelo menos um dos banheiros da unidade;

 

– Na cozinha: área de manobra com amplitude mínima de 180 graus, áreas de aproximação lateral para facilitar o acesso a eletrodomésticos, área de aproximação frontal à pia, altura da superfície da pia e de alcance da torneira especificados pelo adquirente para que se adeque às necessidades de cada comprador;

 

Também estão incluídos no texto adaptações para todos os ambientes, tais como vão livre de passagem das portas; largura mínima dos corredores; tratamento de eventuais desníveis nos pisos no acesso à unidade e em seu interior, incluindo varandas e terraços; alcance visual adequado de janelas e guarda-corpos; faixa de altura dos dispositivos de comando (ou altura especificada pelo adquirente); altura adequada em equipamentos de comunicação como  alarmes, campainha, interfone e luzes quando disponibilizados no empreendimento; além de portas com maçaneta tipo alavanca.

 

“É um grande avanço, sim, mas ainda há muito o que melhorar. Você observa que, atualmente, os apartamentos com adaptações são raríssimos. A Construção Civil não olhava para o setor. Avançamos, mas ainda temos muito o que caminhar nesse aspecto. Principalmente nas construções mais novas. O que tem acontecido, de uma forma geral, é a diminuição do tamanho das unidades e o aumento do preço de venda. Pelo visto a regulamentação veio na hora certa”, diz Carmen.

 

Ela lembra ainda que existem diversas empresas especializadas em adaptações e que, se o morador necessitar, deve procurar uma delas para adaptar sua unidade.

 

“Hoje temos normas técnicas aprovadas e os profissionais como arquitetos e engenheiros já estão começando a ter um olhar para essa questão da acessibilidade. Até mesmo porque na Lei, o profissional é responsável pela planta que assina. Ou seja, a própria LBI fala da responsabilidade do arquiteto e do engenheiro quando assina a planta da obra, sendo assim, estaremos de olho para cobrar por mais melhorias aos deficientes e para as pessoas que precisam”, conclui.

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