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Lar e negócios em harmonia

Por Cidades e Serviços
Última atualização: 14/10/2020

Gabriela Duarte (12) site
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Gabriel Menezes

O síndico precisa lidar com uma série de desafios cotidianos, como, por exemplo, mediar conflitos entre os moradores e supervisionar o trabalho dos funcionários. Se num condomínio com perfil único essas tarefas já demandam tempo e atenção, em locais com característica mista (que reúnem residências e unidades comerciais) o trabalho deve ser redobrado. Um dos maiores desafios desse segmento é que ele reúne duas naturezas completamente distintas dentro de um mesmo local. De um lado temos o condômino que reside e, portanto, deseja tranquilidade e um clima mais familiar, do outro temos o condômino que trabalha e, por consequência, o que procura ser assertivo nas suas exigências, pois se recebe clientes em seu escritório precisa passar uma imagem de sobriedade e seriedade.

Segundo Jean Carvalho, gerente geral de Condomínios da APSA, uma das questões importantes é definir o acesso ao condomínio, tanto para moradores quanto para pessoas de fora, de uma forma que a segurança não seja prejudicada. Neste caso, não há regras específicas sobre esse caso, mas uma boa dose de bom senso ao enxergar a particularidade de casa situação já ajuda e muito. “A segurança, sem dúvida, é um dos pontos mais polêmicos quando falamos de um condomínio misto. No entanto, ainda assim é possível uma convivência amena. Digo que em grande parte a eficiência neste atendimento está relacionado ao treinamento da equipe de funcionários. Quando você tem profissionais devidamente capacitados para exercer essa função e acostumados no trato com esses dois públicos diferentes, eles também conseguem fazer uso da tecnologia, por exemplo, para auxiliá-los nesta tarefa. Tudo fica mais fácil”, garante.

Para ele, o treinamento é, sem dúvida, o ponto fundamental para se manter uma rotina tranquila num condomínio misto. Os porteiros, por exemplo, precisam saber lidar com diferentes tipos de público e dominar bem as suas funções, que são determinantes para a segurança do local. “Condomínios mistos costumam receber entregadores e prestadores de serviços de toda natureza. Esse é o ponto mais delicado e vulnerável. Sabemos que para os bandidos não há limites na criatividade, ainda mais quando se deparam com um condomínio diverso e com movimentação intensa ao longo do dia”, exemplifica.

Marcelo Freire, outro especialista em gestão condominial da APSA, faz coro ao direcionamento de Jean, mas cita ainda outro ponto importante. Segundo ele, tudo deve ser orientado pela Convenção e o Regulamento Interno. “Esses documentos devem ser ricos em detalhes e conter todos os limites e determinações que digam respeito à rotina do condomínio levando em consideração esses dois tipos distintos de moradores: o residencial e o comercial. Tudo deve estar ‘amarrado’ para não haver dúvidas. A partir daí, a vida do síndico se torna muito mais fácil”, garante.

Mas se engana quem pensa que essas diferenciações passam apenas pelo tópico controle de acesso e afins. Há ainda outras tantas particularidades, segundo Marcelo, a serem consideradas na hora de gerir um condomínio misto. Como, por exemplo, a divisão das vagas de garagem, os horários estipulados de carga e descarga e ainda o descarte de resíduos. “Para alguns desses itens, como carga/descarga e descarte de resíduos, há legislação específica e precisará ser cumprida. Para a primeira questão, inclusive, o condomínio deverá ter um local para o estacionamento de veículos que facilite essa entrada e saída de mercadorias”, lembra. E será que qualquer tipo de negócio pode ser praticado dentro de um condomínio neste estilo? “Tudo vai depender do que diz a Convenção, é claro. É através desse documento que será possível saber se será permitido ter um bar, uma peixaria ou qualquer outro tipo de comércio”, orienta Freire, que aconselha muito preparo e jogo de cintura para esses síndicos, já que o objetivo maior deve ser sempre o de preservar o patrimônio de todos e garantir que as relações sejam harmônicas entre todas as partes envolvidas.
Definição dos valores de condomínio podem virar caso de justiça

Infelizmente, não existe uma legislação específica para condomínios mistos. Assim como qualquer outro condomínio, a regulamentação é feita pela Lei nº 10.406/2002 – Código Civil (arts. 1351 a 1358), e a Lei nº 4.591/64. Com isso, algumas particularidades acabam tendo que ser definidas por meio das convenções. “Recomenda-se, nesse caso, que desde o projeto imobiliário e sua incorporação haja o envolvimento de uma equipe multidisciplinar composta por juristas, arquitetos, engenheiros e profissionais com relevantes experiências na área de administração e gestão condominial. Juntos, eles terão capacidade de prever as principais fontes de conflito e minimizá-las mediante a estipulação das melhores regras de convivências, sempre de acordo com as regras gerais previstas na lei”, explica Leandro Lopes, especialista em Direito Imobiliário.

Ele conta que são comuns disputas judiciais envolvendo esse tipo de condomínio justamente pela falta dessas definições prévias. “Na maioria das vezes, são processos contra unidades comerciais, devido ao seu alto nível de gasto, com o objetivo de reequilibrar as contas do condomínio. Esse problema poderia ser facilmente solucionado já à época da incorporação e projeto, por meio de escalonamento de nichos de negócios com suas respectivas cotas condominiais já predefinidas nas Convenções de Condomínio”, destaca o advogado, ressaltando que também são comuns processos referentes às áreas comuns, seja pelo grande fluxo de pessoas nos imóveis comerciais, os horários e à segurança.

A definição dos valores das cotas dos condomínios é uma das questões que costumam afligir o síndico. Segundo Lopes, é preciso haver uma separação clara do que é gasto comercial e o que é residencial. “Não é crível que em um condomínio misto tenha um medidor coletivo de água para todos, por exemplo. Isso implicaria que unidades comerciais rateassem o consumo de água com unidades residenciais, que são bem diferentes. O mesmo pode se dizer quanto ao consumo de energia, já que as unidades comerciais provavelmente teriam um consumo maior do que as unidades residenciais. Portanto, o ideal é que algumas despesas sejam separadas por natureza da unidade, se comercial ou residencial, na medida em que haja uma diferença dos respectivos consumos. Por outro lado, o custeio com a estrutura e a manutenção das áreas comuns de uso comum deve ser rateado por todos, visto que ambas se beneficiam de todo o aparato disponibilizado”, frisa o advogado.

Sobre o controle de acesso de pessoas no condomínio, o ideal, segundo Lopes, é que as regras sejam estabelecidas na convenção, buscando sempre o bom-senso. “Criar restrições visando privilegiar segurança e prejudicar a atividade econômica ou vice-versa não nos parece a melhor solução. O ideal é criar regras que não prejudique ninguém. A convenção pode proibir, por exemplo, que unidades comerciais funcionem com grande fluxo de pessoas ou que gerem ruídos, como uma boate, a partir de um determinado horário. O importante é que tudo esteja descrito em documento. Sem isso, não cabe ao síndico fazer qualquer restrição”, conclui.

Já a modificação de unidades de uso residencial para comercial ou vice-versa depende da aprovação unânime dos condôminos, de acordo com o artigo 1.351 do Código Civil.

Gestão descentralizada pode facilitar o dia-a-dia do síndico

Assim como qualquer espécie de condomínio, o misto deve ter apenas um único síndico, mas, uma prática indicada por especialistas é que ele (o síndico) descentralize a gestão, delegando funções a subsíndicos e conselhos consultivos. “Todo condomínio tem um CNPJ que lhe atribui uma característica jurídica e só é possível ter um síndico por CNPJ. Esta pessoa é a representante legal e quem vai responder por qualquer questão relacionada ao local. No entanto, nada impede que esse gestor delegue funções a subsíndicos”, afirma Leandro.

Ele cita o exemplo de um condomínio que tinha quatro torres, sendo duas comerciais e duas residenciais. O síndico poderia eleger um subsíndico para cada torre, permitindo que eles façam a gestão localizada, mas sem deixar de se manter informado sobre as ações. “Os condôminos da torre comercial não precisam participar, por exemplo, de uma reunião sobre a área de lazer. Isso pode ser feito apenas pelos interessados. O importante é que o síndico, mesmo com funções delegadas, mantenha-se informado de tudo, pois, no fim das contas, é ele quem responderá legalmente por todas as ações, tendo ou não participado diretamente”, conclui o advogado.
Dificuldades de gestão em tempos de crise

Administrado pela APSA, o condomínio Aníbal Machado, em Ipanema, é composto por 13 apartamentos e 15 lojas. Por conta de uma reforma na área de recreação e nas escadas do prédio, a síndica, Gabriela Duarte, precisou estabelecer cotas extras de condomínio. O problema é que cinco lojas das galerias foram desocupadas por conta da crise econômica. “Com as lojas vazias, resta aos donos pagarem às cotas extras, como estabelece a convenção. No entanto, é uma dificuldade muito grande conseguir a aprovação de todos neste sentido”, explica.

Ela conta que o maior impasse para gerir um condomínio misto é justamente fazer com que todos os condôminos concordem com as ações necessárias. De resto, é preciso ter um controle absoluto de tudo o que acontece para evitar transtornos. Por exemplo, se alguma loja vai receber uma entrega, é necessário que o lojista a avise por meio do grupo de WhatsApp dos condôminos e faça uma solicitação por escrito que será assinada por ela e entregue na portaria. “O porteiro só libera a entrada se a solicitação assinada por mim estiver nas mãos dele. Certa vez tivemos um roubo e isso me fez reforçar a segurança com câmeras e funcionários. Temos segurança na galeria da parte da manhã até a hora de fechar”, conta a síndica, que está no cargo há oito anos.

As unidades residenciais e a galeria comercial possuem portarias distintas com seus respectivos porteiros. Da mesma forma, as contas de água e luz são separadas. “O recebimento das cobranças é outra questão da qual precisamos estar sempre atentos, já que o endereço é o mesmo, tanto para a área comercial quanto residencial”, destaca.

Natureza da unidade comercial pode ser problema

Outra questão que afeta diretamente o dia a dia de um condomínio misto é a natureza das unidades comerciais. No Edifício Araxá, em Copacabana, por exemplo, são nove apartamentos residenciais e duas unidades comerciais: uma ótica e um bar. Este segundo se transformou num pesadelo para os moradores durante anos por conta da música alta. “Eu recebia reclamações diárias, não só dos moradores do condomínio como dos vizinhos. Os donos antigos do bar eram pessoas com quem não conseguíamos ter muito diálogo e o problema não tinha solução. Além disso, o bar estava com infiltrações que estavam afetando a garagem e eles também não resolviam essa questão”, diz a síndica, Nazareth Mendonça.

Ela ressalta que os problemas se atenuaram há alguns anos depois que o bar trocou de proprietário. “De vez em quando ainda temos problemas com a música e principalmente com barulhos causados pelos clientes. A questão é que o atual dono do bar é uma pessoa de diálogo aberto, então conseguimos sempre resolver a situação amigavelmente. Uma boa medida tomada por ele, por exemplo, foi retirar a caixa de som que ficava na calçada e levar para dentro do bar. O diálogo é melhor para todo mundo, pois nós também não queremos atrapalhar o negócio de ninguém. Só queremos paz e tranquilidade nas nossas casas”, ressalta.

 

Dicas para a gestão de um condomínio misto

É imprescindível criar duas portarias separadas para o condomínio, uma para a área comercial e outra para a residencial, e se possível com funcionários específicos;

Os porteiros devem passar por um treinamento reforçado para dominar todas as suas funções, como, por exemplo, a identificação de visitantes. A segurança do condomínio depende diretamente disso;

É preciso haver uma separação clara do que é gasto comercial e o que é residencial. Não é crível que em um condomínio misto tenha um medidor coletivo de água para todos, por exemplo;

Especialistas sugerem que o síndico de um condomínio misto faça uma gestão descentralizada, com subsíndicos responsáveis por cada área.

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