Coleta de lei
Por Cidades e Serviços
Última atualização: 12/07/2013
Edição 209 Jul/Ago 2013, Edições, Últimas Notícias
No último dia 12 de junho, o meio ambiente ganhou mais uma aliada e os síndicos mais um objeto de preocupação: a lei 6.408 entrou em vigor e tornou obrigatória a existência de recipientes de coleta seletiva em todas as edificações residenciais com mais de três andares. De acordo a legislação, de autoria do deputado Luiz Paulo (PSDB), os condomínios devem providenciar coletores para a separação de papel, plástico, metal e vidro. O objetivo é reduzir a geração de resíduos sólidos, incentivando o consumo e a utilização sustentáveis dos recursos naturais.
Apesar de vigente, a lei ainda é vaga e deixa em aberto aspectos importantes relacionados à implantação e à coleta do lixo pré-selecionado pelo condomínio. Esse fato tem confundido alguns síndicos, que encaram o processo como algo mais complicado do que, na verdade, é.
Como separar os materiais? Que adaptações será necessário promover no condomínio? Onde o lixo deve ser armazenado? Quem fica responsável pela coleta do material pré-selecionado? Essas são algumas das dúvidas que pairam na cabeça dos administradores e acabam atrasando o processo de implementação da coleta.
O primeiro passo é entender o que é a coleta seletiva e como ela se insere no tratamento dado ao lixo nas grandes cidades. Resumidamente, esse sistema é a base da reciclagem e da reutilização de recursos. Na coleta seletiva, os materiais recicláveis são separados de acordo com a sua natureza — papel, plástico, vidro, metal, madeira, resíduos perigosos etc. Depois de pré-selecionados, podem ser reutilizados para a fabricação de matérias-primas ou servem para criar outros produtos.
A reciclagem e a reutilização de materiais são ações extremamente benéficas ao meio ambiente, na medida em que permitem a economia de recursos naturais e desafogam os problemáticos aterros sanitários das regiões metropolitanas. O lixo, em vez de parar no lixo, se insere no ciclo de produção de outros produtos. Para se ter ideia, segundo dados da Secretaria de Meio Ambiente do Estado de São Paulo, uma tonelada de papel reciclado evita o corte de 15 a 20 árvores, economiza 50% de energia elétrica e 10 mil metros cúbicos de água. Da mesma forma, 100 toneladas de plástico reciclado substituem a extração de uma tonelada de petróleo e uma tonelada de vidro reciclado impede a extração de 1,3 tonelada de areia. “O ideal é que todos façam algo pelo meio ambiente, e os condomínios se enquadram nisto. A coleta seletiva é importante não só para a natureza, mas tem também um viés social, já que emprega pessoas que atuam em cooperativas de lixo”, pontua Marcelo Guedes, gerente comercial da CGM, empresa que, há 17 anos, trabalha com coleta, transporte e manuseio de resíduos.
Depois de se convencer da importância da separação do lixo, é a vez de o gestor persuadir seus condôminos sobre o assunto. Esse é um dos passos mais fundamentais e, ao mesmo tempo, mais difíceis do processo de implantação do sistema de coleta seletiva em um condomínio. Os moradores precisam estar engajados e comprar a ideia. Por ser realizada em diferentes etapas, a coleta seletiva só funciona se houver um trabalho em equipe, que envolve, além de síndico e condôminos, funcionários, poder público e o Terceiro Setor.
Para despertar a consciência ecológica em seus vizinhos, vale tudo: palestras educativas, manuais de Coleta Seletiva e cartazes com as vantagens da reciclagem e da preservação dos recursos naturais. “Também é interessante fazer uma pesquisa de opinião buscando conhecer a disposição das pessoas a aderirem ao programa. É muito frequente os condôminos se manifestarem dispostos e o fato de ter havido essa consulta anterior à implantação do programa aumenta a adesão. As pessoas se sentem envolvidas e contempladas no processo de planejamento da implantação”, destaca Pólita Gonçalves, gerente de Educação Ambiental do Instituto Estadual do Ambiente (INEA-RJ).
Fátima Schmidt, síndica do Condomínio Florença, no Engenho Novo, está fazendo a sua parte. Pesquisou sobre o tema na Internet, reuniu material informativo e visitou condomínios que já instalaram a coleta seletiva. A gestora, à frente do edifício de 60 unidades há dois anos, conta que implantar a seleção de lixo era um desejo antigo, facilitado agora pela aprovação da lei 6.408: “O problema é que não tínhamos um local para o armazenamento do lixo pré-selecionado. Com a publicação da nova lei, convoquei uma assembleia e conversei com os condôminos. Decidimos então utilizar o espaço das vagas de carros visitantes para construir um depósito para o lixo. A lei acabou ajudando as pessoas a se conscientizarem e a aprovarem a decisão”, narra.
Comece agora mesmo
Para facilitar, o ideal é que o gestor encare a coleta seletiva no condomínio como um projeto com três fases distintas: o planejamento, a implantação e a manutenção. Antes de mais nada, é preciso levantar algumas informações sobre a rotina de lixo dentro do condomínio: a quantidade média de resíduos produzidos pelos condôminos, as instalações físicas para armazenagem do lixo, o número de funcionários que serão envolvidos na coleta, quantos coletores serão necessários e os meios de descarte desse material.
Feito isso, cabe ao síndico, auxiliado ou não pelos vizinhos, decidir questões relacionadas à parte operacional do sistema. Ele definirá quem fará a coleta, onde será estocado o material e para quem será doado ou vendido o lixo pré-selecionado. É nesta fase de planejamento que Bruno de Oliveira, síndico do Nova Veneza, em Vargem Pequena, se encontra. O condomínio possui seis lixeiras e o gestor pretende destinar duas delas para a estocagem do lixo proveniente da coleta seletiva. Mas, antes disso, está averiguando que tipo de obras e reparos serão necessários. “A gente já faz coleta seletiva, mas de forma rústica. Não temos coletores; o lixo é acondicionado em sacos. Estamos estudando, porque, talvez, o projeto das lixeiras seja alterado. Mas, antes, precisamos entender como devem ser os depósitos, se precisam ter saída de escape, se podem ser fechados, se vamos mexer nas suas dimensões de entrada e saída. São pontos ignorados pela lei e que serão discutidos em assembleia”, afirma o gestor.
Já na fase posterior, a de implantação, é a vez de orientar os funcionários escalados para a coleta. “Faça um treinamento para que eles operem o programa interno de modo eficiente e coerente. Para que o projeto tenha mais coerência, participe seus funcionários das decisões do condomínio, já que são eles que operam o sistema de limpeza do prédio”, afirma a representante do INEA-RJ.
É nesta etapa também que os coletores para o acondicionamento dos resíduos são comprados. Na hora da compra, o gestor deve lembrar que os contêineres escolhidos precisam estar dentro da norma brasileira ABNT 15.911, que normaliza a fabricação das lixeiras, conferindo qualidade, segurança e durabilidade a elas.
Para comemorar o sucesso do trabalho realizado e, ao mesmo tempo, ampliar o engajamento dos condôminos, alguns síndicos costumam organizar um evento para marcar o início do programa de coleta seletiva. Pode ser algo simples, como uma palestra, mas o importante é que seja bem divulgado, tenha uma aura de festa e propicie o livre trânsito das informações sobre o processo.
A terceira e última etapa é a de manutenção e, para realiza-la, é interessante continuar a abastecer os condôminos com informações e resultados da coleta, entre eles a quantidade de lixo reciclado armazenado por mês, por exemplo. “Deve-se fiscalizar os resíduos já nos coletores e, por amostragem, verificar se estão sendo separados corretamente. Além disso, sempre que possível, os funcionários devem orientar os condôminos e esclarecer eventuais dúvidas”, sugere Marcelo Guedes.
Separação e classificação do lixo
A separação do lixo entre orgânico e reciclável fica a cargo dos condôminos e deve ser realizada nas próprias unidades. Duas lixeiras são suficientes: uma será utilizada para o depósito do lixo orgânico, ou seja, restos de alimentos, ossos e cascas. Já para a lixeira da coleta seletiva serão destinados materiais secos, como latas, plásticos, vidros e papéis. Antes de serem descartados, é importante que esses recipientes sejam lavados com água para retirar resíduos, evitar contaminação e odor forte.
Há algum tempo, Bruno de Oliveira, o síndico de Vargem Pequena, vem realizando a separação de materiais em casa. Ele argumenta que o processo interfere pouco em sua rotina de afazeres diários. “A coleta seletiva não me dá dor de cabeça como síndico. Tampouco como morador. É tão simples: basta separar vidro, garrafas plásticas, metais e papelão. Você só tem o trabalho de, em vez de jogar no lixo comum, reservar os materiais na outra lixeira. Com o tempo, isso fica automático”, pontua.
Cada andar do condomínio Florença, no Engenho Novo, receberá depósitos específicos para os materiais recicláveis. “Próximo à lixeira de cada andar, vamos colocar uma prateleira onde deverão ser colocados jornais, revistas e demais papéis. Abaixo dela, haverá um engradado onde serão depositados vidros, metais e plásticos. E, pelo conduto do lixo, os resíduos orgânicos serão jogados normalmente”, narra Fátima Schmidt, síndica do edifício.
Já a classificação do lixo é a fase onde os materiais são separados em lixeiras de acordo com o seu tipo. Esta acontece depois da separação e fica sob a responsabilidade do condomínio. Depois de recolherem os materiais separados pelas unidades, os funcionários do edifício realizam uma nova triagem do lixo, separando-o em coletores específicos que serão armazenados nos depósitos do condomínio até a coleta.
Para facilitar a identificação, o síndico deve adquirir os famosos contêineres coloridos, que indicam, pela cor, o material a ser depositado ali. Como a lei 6.408 estipula a coleta apenas de papel, plástico, metal e vidro, as lixeiras a serem compradas devem ser das cores azul, vermelho, amarelo e verde, respectivamente. O ideal é que esses coletores tenham tampas, para evitar que o cheiro do lixo se espalhe, e rodas, o que facilitará no deslocamento até o caminhão coletor.
Se o engajamento dos condôminos na coleta seletiva for alto, o síndico pode orientá-los a promover a classificação ainda em casa. Para isso, a dica é simples: basta acoplar quatro ganchos distintos de sacos de lixo na parede e dedicar cada um deles para um tipo de material. “Caso haja uma grande concentração de garrafas de vidro, o condomínio deve providenciar a melhor forma de acondicioná-las, já que podem causar acidentes antes da coleta. Também há que se ter atenção com materiais perigosos que não fazem parte da coleta seletiva, como lâmpadas fluorescentes, pilhas e baterias, restos de tinta, embalagens de lubrificante, remédios e venenos”, alerta a gerente de Educação Ambiental, Pólita Gonçalves.
Coleta
Os condôminos separaram o lixo, os funcionários classificaram e alocaram os materiais em seus devidos coletores. Estes foram então armazenados na lixeira reservada para a coleta seletiva do condomínio. Tudo certo e como manda o figurino. Mas e agora? O que fazer para o lixo pré-selecionado ser recolhido do prédio?
Depois de todo esse processo, chegou a hora de providenciar a coleta do lixo. A Companhia de Limpeza Urbana do Rio de Janeiro (Comlurb) desenvolve, desde 1993, um programa de coleta seletiva. Uma vez por semana, caminhões da entidade comparecem ao condomínio para retirar os resíduos recicláveis. Para isso, a Comlurb exige que o lixo esteja limpo e seja acondicionado em sacos transparentes para facilitar a visualização do material reciclável.
O condomínio de Bruno de Oliveira adota o sistema: “um de nossos moradores fez contato com a Comlurb. A partir daí, toda sexta-feira, vem um veículo de pequeno porte aqui para recolher o material reciclado. A gente só tem que tirar o lixo do depósito e colocar pra fora, porque eles não entram no condomínio; pegam diretamente na rua”, conta o síndico de Vargem Pequena.
A coleta promovida pela Companhia, entretanto, não abrange todos os pontos do estado. Por enquanto, o serviço é oferecido na Zona Sul e em parte das Zonas Norte e Oeste da cidade do Rio de Janeiro. (Para conferir a lista de bairros contemplados, acesse o site da Comlurb na Internet, pelo endereço: http://www.rio.rj.gov.br/web/comlurb/exibeconteudo?article-id=129500
Aliás, este não é um problema restrito ao estado do Rio de Janeiro. Segundo um estudo realizado pelo IBGE, cerca de 22 milhões de brasileiros têm acesso a programas municipais de coleta seletiva. Mas, apesar de o número de programas ter dobrado no Brasil entre 2000 e 2008 (passou de 451 para 994), o serviço contempla apenas 18% da população local.
Contatada pela redação da APSA, a Coordenadoria de Comunicação Empresarial da Comlurb não quis comentar o assunto, mas adiantou que “está em fase de preparação para uma nova etapa do serviço de coleta seletiva”. Apesar da perspectiva, os problemas logísticos têm levado os síndicos a questionarem se, de fato, a empresa estará preparada para fazer sua parte e auxiliar os condomínios a cumprirem a lei 6.408. Preocupados, alguns querem se antecipar e buscam alternativas para o descarte do lixo pré-selecionado.
Uma das mais viáveis é a de combinar a coleta com empresas especializadas ou cooperativas de catadores que retiram os materiais selecionados e encaminham para as usinas de reciclagens. Ao optar por essa saída, o síndico pode vender os resíduos separados e acabar gerando uma fonte de renda para o condomínio. Uma das desvantagens é que, no geral, as empresas compradoras só retiram o lixo em grandes quantidades, o que obriga o condomínio a dispor de um espaço relativamente maior para armazenar os resíduos até a data da coleta. “Já entrei em contato com a cooperativa. Estão à espera do meu aval. Assim que o sistema for implantado e a gente juntar quantidade de lixo suficiente, vamos acioná-la e ela vem ao condomínio buscar o lixo. É a mesma cooperativa que recolhe o lixo do prédio vizinho. O trabalho é sério e eles são bem pontuais”, conta Fátima Schmidt, afirmando que pretende dividir os recursos advindos da venda do lixo entre os funcionários destacados pelo condomínio para a coleta seletiva. “A ideia é destinar parte do dinheiro aos empregados para que eles se sintam estimulados a fazer a coleta corretamente. Além disso, gastei cerca de mil reais com a compra das lixeiras. Em médio prazo, posso recuperar esse investimento com a venda do lixo. Com o tempo, quero que os condôminos percebam que há retorno financeiro com a atividade de coleta seletiva, que é bom para o planeta, para o condomínio, pra todo mundo”, finaliza.
Guia simplificado para a implantação da coleta seletiva no seu condomínio
1º – Levante informações sobre a rotina do lixo em seu condomínio;
2º – Defina a equipe de funcionários que ficará responsável pelo sistema, onde o material reciclado será armazenado até a coleta e como será feita a retirada do lixo pré-selecionado do condomínio;
3º – Compre os coletores e faça os reparos necessários na infraestrutura do condomínio;
4º – Treine os funcionários, mostrando como e o que deve ser feito;
5º – Promova divulgação ampla do sistema de coleta seletiva para os condôminos e, se possível, crie um evento para marcar a inauguração do programa;
6º – Divulgue os resultados mensalmente e esteja sempre disponível para tirar dúvidas de seus vizinhos.
Texto: Aline Duraes