Em tempos de eventos climáticos extremos, sociedade, governos e até condomínios são elementos vitais para amenizar impactos. Entenda.
Por Cidades e Serviços
Última atualização: 10/04/2023
Atualidade
Os estragos causados pelas chuvas e períodos prolongados de estiagem que resultam em falta de água em diferentes regiões do país são apenas alguns exemplos como os eventos climáticos cada vez extremos e frequentes afetam o nosso dia a dia. E é papel de todos agir para que essa situação não se agrave e que as gerações futuras possam ter uma qualidade de vida adequada.
Pesquisador na área de planejamento urbano da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Tomás Aboim tem como assunto principal de estudo as adaptações urbanas à emergência climática e as soluções baseadas na natureza. Na visão dele, nunca houve uma preocupação tão grande com relação ao tema como atualmente, mas ela ainda está longe de ser a atenção ideal e necessária. É preciso encarar os eventos climáticos extremos como o que de fato são: uma emergência. É necessário ter mais ações em conjunto entre todas as esferas, com especial foco nas administrações municipais. Apesar da emergência climática ser um problema de origem global, é na esfera local que os problemas concretos aparecem e precisam ser lidados de forma prática.
“Porém, o que mais ocorre no Brasil são cidades sem expertise técnica e sem dinheiro para lidar com os problemas ambientais urbanos. Portanto, a virada de chave deve ocorrer principalmente na relação entre as políticas públicas de auxílio técnico e financiamento federal e estaduais para a ação climática local nas ruas e nos bairros dos municípios Brasil afora”, diz.
Ele acrescenta que os condomínios também podem ser elementos importantes nessa transformação. Há, por exemplo, muitos tetos ociosos nos prédios da cidade que poderiam ser transformados em Infraestruturas Verdes como telhados vegetados. Estudos demonstram um arrefecimento de até 11 graus na temperatura de edificação com telhados verdes durante o verão no Rio de Janeiro, levando a uma enorme economia de ar condicionado.
“Esses tetos ociosos podem ser ocupados também por painéis solares, que estão cada dia mais baratos e com subsídios do governo. Levando a um investimento de rápido retorno. Em menos de dois anos você tem de volta o valor investido e passa a pagar pelos próximos anos uma taxa irrisória de conta de luz. O melhor de tudo é que dá para aliar telhados vegetados com painéis Solares”.
Além disso, aponta o especialista, há cada vez mais empresas especializadas em recolher e cuidar do lixo orgânico de clientes. Condomínios e grandes prédios costumam receber ofertas e condições especiais, especialmente se junto a isso também incentivarem seus moradores a separar e reciclar seus lixos não orgânicos.
Cidades precisam colocar a questão em pauta
Para o pesquisador da UFRJ, Tomás Aboim, as cidades precisam investir e buscar soluções para lidar com as emergências climáticas. Ele diz que é preciso contratar especialistas em planejamento urbano para, junto à população, criarem Planos de Ação Climática.
No momento, ressalta, no Brasil só as cidades de Salvador, Recife, Campinas, São Paulo, Rio de Janeiro e Curitiba possuem esses planos estruturados de forma transversal e robusta. “Há, no entanto, diversas cidades dentre nossos mais de 5000 municípios que merecem atenção também por ações pontuais de sustentabilidade urbana, e não podemos esquecer que finalmente temos um governo federal apoiando a causa climática, com um Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima robusto e operante”.
Esferas pública e privada precisam adotar ações emergenciais
Pesquisador e um dos líderes do Grupo de Estudos em Meio Ambiente e Direito da Universidade Federal Fluminense (UFF), Pedro Curvello Saavedra Avzaradel cita algumas ações essenciais para mitigar o impacto dos eventos climáticos extremos nas cidades.
“Muita coisa pode e precisa ser feita. Por exemplo, políticas habitacionais sérias com a retirada das populações em áreas de risco, implementação de sistemas eficientes de drenagem, desassoreamento e recuperação de rios, lagos e lagoas – com a recomposição das áreas de preservação permanente (APPs) -, reflorestamento de morros e criação de áreas verdes. Esses são apenas alguns exemplos mais gerais. Cada município deve fazer a sua estratégia a partir das suas peculiaridades.
Sobre o setor privado, ele frisa: “As empresas devem melhorar o desempenho ambiental e climático, reduzindo as emissões de gases de efeito estufa. E podem apoiar iniciativas do terceiro setor voltadas, por exemplo, à criação, manutenção ou expansão de áreas verdes, a recuperação de áreas degradadas, obras de adaptação nas áreas vulneráveis que sejam compatíveis com a legislação ambiental e urbanística”.
Temos muito a fazer e pouco tempo para isso, avalia especialista
Quando o assunto é lidar com os efeitos cada vez mais extremos e frequentes das mudanças do clima, a humanidade tem muito o que fazer e pouco tempo para isso, pois boa parte da nossa permanência climática no planeta já foi comprometida. A avaliação é da especialista Andrea Borges de Souza Cruz, docente com mais de 20 anos de experiência nas áreas de projeto de arquitetura, sustentabilidade, design, planejamento urbano e gestão ambiental. Ela é autora, ainda, dos livros “Por um planeta mais resiliente” e “Tópicos em Meio Ambiente” .
Segundo Andrea, infelizmente, ainda somos vítimas de uma maquiagem verde, que finge estar preocupada com a seriedade das mudanças decorrentes do clima, mas na verdade usa esse tema para um marketing perigoso. “Devemos ter muito cuidado, pois chegamos em um ponto que a ciência mostra como irreversível. Deveríamos ter feito essa virada de chave há 25 anos. Agora temos que virar a chave, a maçaneta, a porta, a casa toda, ou nossos netos não terão muito do que se orgulhar de nós”, alerta.
Ela acrescenta que há exemplos de boas ações pontuais neste sentido, mas que é preciso entender que o planeta é um ambiente complexo. Essa complexidade exige ações mais eficientes que busquem uma sustentabilidade de fato. Não adianta tratar o transporte sem lembrar do saneamento. Assim como não adianta legislar para o incentivo ao verde enquanto existem milhares ou milhões de famílias dormindo na rua. “É preciso planejamento urbano e ambiental. Esse é o modo mais adequado e eficaz para tratar essa questão”.
Por: Gabriel Menezes