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Mudanças à vista

Por Cidades e Serviços
Última atualização: 13/10/2020

matéria 01
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Aline Durães

O ano de 2019 começou com novo fôlego às construções imobiliárias cariocas. Logo
no mês de janeiro, a Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro aprovou e o prefeito
Marcelo Crivella sancionou o Código de Obras e Edificações Simplificado (Coes),
promovendo mudanças significativas na edificação de novos empreendimentos.

Estabelecidas na década de 1970, as normas edilícias em vigor até o início de 2019
refletiam o modo de vida e organização social de seu tempo. Estavam defasadas e já
não davam conta dos desafios impostos pelas dinâmicas sociais contemporâneas.
Entre os especialistas, é consenso que a legislação urbanística carecia de atualização.
“O antigo código já não refletia os dias de hoje, pois as formas de viver foram
mudando. Na década de 1970, a visão do ambiente urbano e do mercado desejável
era completamente diferente daquilo que se almeja atualmente. O Coes passa a
refletir mais o atual estilo de vida”, enfatiza Ely Lima, gerente administrativo da
Construtora Araújo Lima, pontuando, ainda, a burocracia excessiva como o principal
entrave apresentado pela legislação anterior. “Os principais empecilhos eram o
excesso de licenças e as exigências que éramos obrigados a cumprir, além do tempo
de análise dos processos”.

O primeiro avanço notório da nova legislação foi a redução no número de artigos. Os
quase 600 da anterior saem de cena para dar lugar a apenas 41. Com isso, simplifica-
se o ajuizamento sobre temas ligados a construções e diminui-se a insegurança
jurídica gerada pelo excesso de leis. “Quanto menos regras e intervenções do poder
público no direito de construir, mais fácil fica para o empresário do ramo de construção
e — o mais importante — mais liberdade para o proprietário em seu direito”, destaca
André Luiz Junqueira, sócio da Coelho, Junqueira e Roque Advogados.

Elaborado por técnicos da Secretaria Municipal de Urbanismo, o novo Código de
Obras e Edificações Simplificado traz uma série de mudanças que visam deixar mais
simples a vida de quem constrói empreendimentos imobiliários na cidade do Rio de
Janeiro. A ideia é facilitar o trabalho das construtoras e incorporadoras, estimular o
lançamento de projetos e, assim, aquecer o mercado carioca de imóveis. “É esperado
que o novo código abasteça as construtoras de possibilidades em termos de projetos,
reduzindo seus custos e trazendo para a população imóveis com valoreis bem mais
acessíveis”, prevê Ely Lima.

Entre as mudanças sugeridas pela legislação recém-aprovada, estão pontos
nevrálgicos da vida condominial, como vagas em garagem, áreas de lazer e varandas.
Daí a importância de síndicos e gestores condominiais se inteirarem do tema. “Leis,
regras, normas e procedimentos são fundamentais para um gestor, seja ele do meio
público ou do meio privado, pois norteiam as ações, as condutas e a nossa
imparcialidade”, enfatiza Luiz Henrique Ribeiro, síndico do Duo Prime, condomínio
com 80 unidades em Botafogo.

Metragem mínima
Uma das mudanças mais significativas impostas pelo novo código de obras diz
respeito à metragem mínima das unidades. Pelas regras antigas, os apartamentos
deveriam ter área mínima de 28 metros quadrados, para imóveis localizados no Centro
e na Zona Norte, e de 60 metros quadrados, para os da Zona Sul. Ou seja, nenhum
empreendimento poderia ter dimensão menor do que a estipulada para a respectiva
região.

A partir de agora, os novos limites mínimos são de 25 metros quadrados, para todas
as regiões, com exceção da Barra da Tijuca, Vargens Grande e Pequena, Recreio dos
Bandeirantes e Ilha do Governador. Nesses bairros, somente poderão ter área mínima
de 25 metros as unidades localizadas próximas a comunidades e favelas.

Para especialistas no mercado de construção, essa é uma das medidas com maior
potencial de sucesso. “A antiga regra inviabilizava a construção de imóveis com maior
área construída, pois o empreendimento acabava ficando caro, em especial em certas
regiões como a Zona Sul do Rio. Desta nova forma, podemos ter unidades compactas
que irão atender a uma camada bem grande que visa morar em melhor localização”,
pontua Ely Lima, da Araújo Lima Construtora.

Segundo o prefeito Marcelo Crivella, a medida ajuda, inclusive, no combate à
favelização. “Unidades menores vão baratear o custo dos projetos, tornando a cidade
mais humana ao permitir que pessoas com menos recursos comprem unidades em
lugar de procurarem alternativas como favelas (…). O Rio hoje tem muitas favelas
porque o imóvel é caro. A única maneira de mudar isso é aumentar o mercado”,
enfatizou o prefeito, em entrevista ao portal Globo.com, em 14 de janeiro de 2019.

Um dos entes mais críticos ao código de obras, o Conselho Regional de Arquitetura e
Urbanismo (CAU/RJ) lembra a importância de o quesito qualidade guiar a construção
das habitações sob a égide da nova legislação. “A redução do tamanho dos
apartamentos para praticamente todo o Rio de Janeiro, sem considerar as
especificidades e condições de infraestrutura das localidades, pode jogar por terra
qualquer conceito de cidade compacta que se desejava. No aspecto arquitetônico,
certamente, estas medidas trarão mais possibilidades de soluções projetuais.
Entretanto, essa ‘liberdade’ não pode jamais se sobrepor à qualidade da habitação. A
nova lei, por exemplo, reduz de 20 a 25% as áreas de ventilação. Concretamente, isso
não tem nada a ver com ‘atualizar a lei ao estilo de vida contemporâneo’ e sim com a
intenção de reduzir os custos da construção civil”, problematiza Lucas Faulhaber,
coordenador da Comissão de Política Urbana do CAU/RJ.

Varandas e garagens
A queridinha dos condôminos também foi tema de alterações no novo código de obras
e edificações do Rio de Janeiro. Ele não restringe mais a área das varandas. Na regra
anterior, os espaços podiam ocupar, no máximo, 20% do total da área útil da unidade.
Com o novo código, não há mais limite legal.

Mais uma vez, os especialistas dividem opiniões quanto à validade da proposta. Para
as construtoras, isso representa maior liberdade nos projetos. “A varanda tem se
tornado, nos últimos anos, o espaço mais cobiçado e coringa nos apartamentos. Com
a necessidade do setor em tornar as plantas dos apartamentos cada vez mais
atrativas, mesmo em pequenas e médias metragens, identificou-se nesse formato a
possibilidade de se criar espaços mais práticos, versáteis, multifuncionais e
integrados. Com o novo código, teremos ainda mais liberdade”, afirma Ely Lima.

Para alguns setores dos Conselhos Profissionais, a nova regra institucionaliza uma
prática clássica das unidades com varanda: a mais-valia. “Na medida em que o
parâmetro de tamanho mínimo das unidades foi reduzido e se exclui as varandas do

cálculo da área total edificável, a tendência é a produção de soluções arquitetônicas
que privilegiem mais esse espaço externo. O problema é que o Coes admite a
possibilidade de fechamento posterior das varandas. O instrumento excepcional da
‘mais-valia’, que já vem sendo banalizado nos últimos tempos, passa a virar regra”,
afirma Lucas, do Conselho Regional de Arquitetura e Urbanismo, referindo-se à
regularização do fechamento de varandas por meio de pagamento de taxa à
Prefeitura.

Tão polêmica quanto a mudança nas varandas é a regra que diz respeito às garagens
e estacionamentos dos novos empreendimentos residenciais. De acordo com o Coes,
as unidades localizadas em um raio de 800 metros de distância de estações de metrô,
trem, BRT e VLT deverão oferecer vaga em garagem para apenas um a cada quatro
apartamentos. Na prática, isso significa que os edifícios terão vaga na garagem para
apenas 25% de seus proprietários.

O principal argumento para o novo texto é a mudança na forma de mobilidade que o
cidadão urbano vem experimentando nos últimos anos. Os legisladores afirmam: é
crescente o número de pessoas que se deslocam pela cidade por meio do transporte
público e via aplicativos, como Uber e Cabify, e já não possuem veículos próprios para
locomoção. “A redução de vagas de garagem está em harmonia com dois outros
pontos: o de redução de veículos na cidade (tanto para reduzir seu impacto ambiental
como também o tráfego), bem como com o incentivo ao uso do transporte público (que
também deve ser aprimorado no Rio de Janeiro)”, aponta o advogado André Luiz
Junqueira, que completa: “A garagem é e continuará sendo um problema comum em
condomínios”.

Para o também advogado Diogo Russo, a nova lei traz desafios ao síndico na gestão
da garagem de sua unidade. “O que define o direito à vaga e como as mesmas serão
utilizadas são, respectivamente, a escritura do imóvel — registrada perante o RGI
competente — e a convenção condominial, que reflete a vontade da maioria absoluta
dos condôminos. Sendo assim, o síndico deverá ficar atento a ideias flexíveis de modo
a não haver prejuízo para parte dos condôminos, como por exemplo: fazer rodízio de
automóveis”, afirma.

Síndico há dez anos, Luiz Henrique Ribeiro acredita que as decisões da assembleia
condominial terão um peso ainda maior para a gestão de unidades construídas sob o
novo código. “Qualquer alteração de procedimento quanto à utilização de vagas, como

a adoção do sistema de rodízio, deve estar sempre sustentada legalmente e
devidamente aprovada em Assembleia”.

Elevadores e áreas de lazer
O novo Código de Obras e Edificações levanta também o debate sobre acessibilidade,
aspecto cada vez mais valorizado pelos lançamentos na atualidade. Em seu parágrafo
quinto, a legislação determina que todas as construções garantam a “acessibilidade à
pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida a todos os compartimentos e
equipamentos de suas partes comuns”. Apesar disso, dispensa a presença de
elevadores em unidades com menos de cinco pavimentos. “É bem possível que essa
medida vise reduzir os custos da obra e de manutenção dos elevadores. A construção
sem a instalação de elevador irá limitar o tipo de comprador daquele imóvel, o que, de
certa forma, imprime uma visão de que o Estado não está dando a atenção merecida
aos deficientes ou com mobilidade reduzida”, avalia Diogo Russo.

Para Ely Lima, gerente administrativo da Construtora Araújo Lima, embora seja um
item crucial ao conforto dos condôminos, os elevadores encarecem até 15% o valor
final de uma unidade. Para ele, a acessibilidade dos novos empreendimentos deverá
ser garantida de outras formas. “As construtoras que não optarem pelo uso do
elevador devem investir em piso regular, firme e antiderrapante, em rampas e escadas
sinalizadas com corrimão e piso tátil, portas de acesso a cadeira de rodas, andadores
e carrinhos de bebê, com vão livre delargura mínima de 80 cm, calçadas
desobstruídas e interfones com marcação em braile. Os banheiros de uso comum
devem ser adaptados e o estacionamento precisa reservar as vagas indicadas por lei”.
Já a tão atrativa área de lazer não será mais obrigatória. O texto do Coes isenta os
novos prédios de contemplar playgrounds. Mais uma vez, o objetivo é adaptar o
projeto ao estilo de vida contemporâneo, reduzindo os custos finais da habitação e,
assim, tornando-a financeiramente viável a uma parcela maior da população. “Os
projetos ficarão menos onerosos para o comprador. Um prédio sem play seria de
grande valia para determinados públicos, especialmente aqueles que trabalham e/ou
estudam e, portanto, não usufruem do pavimento de lazer”, pontua Gerson Almeida,
engenheiro civil e diretor da empresa Laudos Engenharia.

Para o síndico Luiz Henrique, do Duo Prime, as mudanças impostas pelo novo Coes
trazem desafios à função do síndico, que precisará, cada vez mais, se atualizar e
qualificar para o cargo. “Os novos espaços residenciais precisam e devem estar
amparados por avanços das leis e normas. Como gestor condominial, fico satisfeito

que cada vez mais tenhamos esse avanço, respaldado principalmente pelos Órgãos
Públicos. Nosso papel ganhará mais endosso legal e técnico, e os síndicos pouco
profissionais ou sem formação adequada terão que se alinhar”, finaliza.

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