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Dano moral: quando a honra é ofendida

Por Cidades e Serviços
Última atualização: 22/11/2015
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Aline Durães 

Quem conta o caso é o advogado e consultor jurídico da Schneider Associados, Rodrigo Coelho, mas o episódio, infelizmente, é lugar-comum em milhares de condomínios pelo Brasil. Insatisfeita com um dos funcionários da unidade, a condômina escreve queixas no livro de ocorrências. Nos textos, ofende o empregado em questão, deixando registradas as palavras de baixo calão que utilizava para se referir ao colaborador. Cansado das humilhações, ele entra com processo judicial requisitando pedido de danos morais. No fim das contas, cabe ao condomínio pagar a alta indenização ao funcionário.

Fatos como esse alertam para um perigo que ronda a convivência de empregados, síndicos e condôminos: o processo por danos morais. “Dano moral é o que atinge o ofendido não em seu patrimônio, mas em seus direitos da personalidade, como a honra, a dignidade e o bom nome, acarretando tristeza, humilhação, constrangimento, vexame e sofrimento. Qualquer conduta, seja lá de quem for, que se enquadre nos conceitos acima pode ser entendida e declarada como motivadora de dano moral e, por isso mesmo, passível de reparação”, alerta o especialista Rodrigo Coelho.

Foi a Constituição de 1988 que instituiu a noção de dano moral no Direito Brasileiro. De lá pra cá, a Justiça fez valer a lei, aplicando penas sempre que possível, e os cidadãos foram se conscientizando cada vez mais sobre a legislação. Hoje, os processos por danos morais ocorrem não apenas em ambientes de trabalho ou na relação de empresas com seus consumidores, mas também em espaços privados e relações mais próximas como é o caso do condomínio. Daí a importância de o síndico conhecer o tema e tomar medidas preventivas para que as desavenças, muitas vezes ingênuas, não acabem indo parar na Justiça e trazendo sério prejuízo financeiro à unidade.

O síndico André Viana de Souza é sensível ao problema. Ele conta que um dos estopins para a agressão verbal e ofensa ocorre quando os funcionários não conseguem dar a solução que os condôminos julgam ideal para um conflito condominial. “Quando alguém desrespeita a lei do silêncio, por exemplo, é comum o morador ligar para a portaria para reclamar. A orientação é a de que o funcionário faça uma ligação ao apartamento que supostamente produz o barulho e informe que há uma reclamação. Liga depois ao reclamante informando que já pediu a colaboração ao outro morador. Caso o reclamante volte a ligar para o funcionário pedindo que continue intercedendo, o funcionário deve informar que não tem autorização para efetuar mais ligações ao reclamado. É aí que muitos moradores agridem verbalmente o funcionário”, destaca.

Quando ocorre o dano moral?

Qual o limite do dano moral? Como delimitar o que é ofensa simples daquela que atenta à honra? Essas são algumas perguntas comuns. Isso porque, para a maior parte das pessoas, fica difícil distinguir as situações que, de fato, configuram um abuso passível de processo por danos morais.

É importante ter em mente que não é qualquer aborrecimento que gera dano moral. Para a Justiça interpretar um ato como humilhante ou vexatório, é necessário que o episódio tenha sido grave o suficiente para causar desequilíbrio emocional e psicológico na vítima, interferindo em seu bem-estar. Sendo assim, entre as diversas situações que se enquadram nessas características estão a discriminação racial, sexual e de gênero, gritarias e xingamentos, isolamento e a violação de intimidade e privacidade.

E o dano moral pode estar em todo lugar, inclusive na relação dos condôminos entre si e com os síndicos. “Existe uma série de ações do próprio condomínio com os condôminos que podem gerar o dano moral, como por exemplo, o impedimento ao condômino de utilização das áreas comuns, tais como piscina, sauna e academia; o corte indevido de água por estar em atraso com a cota condominial; e avisos afixados em portas de elevadores ou murais com acesso público contendo nome e unidade condominial que está devedora”, explica Marcello Benevides Peixoto, advogado especialista em Direito Imobiliário e Condominial.

Por outro lado, o síndico tem o direito de acionar determinado condômino que ofende sua honra, ao acusa-lo, por exemplo, de corrupção. O próprio condomínio, aliás, pode processar alguém quando tiver sua reputação prejudicada, fato que acontece, por exemplo, quando um fornecedor, erroneamente, promove a negativação da unidade junto aos sistemas de proteção ao crédito.

É importante, entretanto, conhecer também as ações que, embora incisivas, não são geradoras de danos morais. Chamar a atenção de funcionários, protestar títulos em atraso e registrar no boleto enviado para residência o nome do inadimplente são alguns dos casos isentos dessa ordem de injúria. Da mesma forma, discussões verbais entre duas pessoas, sem testemunhas, dificilmente conseguirão ser associadas a danos morais. No geral, a Justiça exige comprovação da ofensa, seja por meio de e-mails, cartas ou testemunho de terceiros.

Quem paga a conta?

Diferentemente dos casos de dano material, nos quais existe prejuízo financeiro, na injúria moral não há como quantificar as perdas. Ainda assim, as vítimas têm direito a indenizações, geralmente fixadas pela Justiça para reparar a dor pelo constrangimento e, ao mesmo tempo, impedir que o ofensor pratique novamente o ato. “A penalidade será dependente do tipo de fato que originou o dano moral. Por exemplo, se for assédio moral, pode gerar danos morais em pecúnia que variam de R$ 5 mil a R$ 30 mil. Se for discriminação culminada com a dispensa de um empregado, pode gerar reintegração, danos morais e até danos materiais. Se for agressão verbal, o empregado pode até fazer boletim de ocorrência na delegacia e depois alegar que sofreu assédio moral e pedir danos morais na Justiça do Trabalho”, elenca Adriana Calvo, advogada trabalhista e doutora em Direito do Trabalho.

É possível, ainda, que a vítima de danos morais tenha acesso ao que os especialistas chamam de reparação não-pecuniária, como um direito de resposta, por exemplo, com o objetivo de reparar parcialmente a injúria.

Nos casos de danos morais em condomínios fica a questão: quem será o responsável pelo pagamento, o condomínio como um todo ou o ofensor individualmente? Segundo os especialistas, a decisão depende de cada caso. “Falando de modo geral, em relação ao condômino, se o funcionário do condomínio provar que está seguindo ordens do síndico poderão ser acionados síndico e condomínio, pois o funcionário é mero representante. Da mesma forma, em relação ao funcionário, creio que o mais correto seja acionar o síndico e o condomínio”, informa Marcello Benevides.

Rodrigo Coelho corrobora a opinião de Benevides. Também para o consultor jurídico da Schneider Associados, na maior parte dos casos, cabe ao condomínio responder judicialmente pelos danos morais perpetrados seja por seus funcionários ou por seus condôminos. Uma decisão que acaba pesando no bolso de todos. “Na grande maioria das vezes, é contra a pessoa jurídica do condomínio que a pretensão é deduzida em juízo, de uma maneira lógica, pois a garantia de recebimento de eventual indenização aumenta significativamente”, afiança.

Como evitar o problema?

Como gestor condominial e responsável pelo bem-estar da unidade, o síndico pode primar por um ambiente livre dos perigos dos danos morais. Uma dica importante é nunca usar adjetivos na hora de falar sobre funcionários e condôminos. Orientar colaboradores para lidar com condôminos, evitando conflitos desnecessários, é outro caminho necessário a seguir.

É preciso também deixar clara aos moradores a premissa de respeito aos empregados. “Em reclamações de moradores sobre decisões ou atos de funcionários, é preciso dar retorno sempre ao morador, informando se o funcionário foi reorientado ou se estava correto, explicando o porquê de tal conduta existir. Se o morador acreditar que sua reclamação à administração não recebeu atenção, em outra ocasião ele tentará resolver o problema à sua maneira. Se ele, entretanto, receber uma resposta embasada, continuará a exercitar este tipo de canal para resolver sua divergência com funcionários”, opina o síndico André Viana.

Para a especialista Adriana Calvo, a prevenção total dos danos morais é impossível. Cabe então ao gestor condominial minimizar ao máximo a possibilidade de ocorrência: “É impossível a prevenção total, mas há a redução de riscos. Há diversas opções: desde contratação de seguro de danos morais até elaboração de cartilhas explicativas para os empregados e moradores do condomínio. Oferecer treinamentos de prevenção explicando aos empregados o que é dano moral e quais seus riscos é uma boa opção também”, finaliza.

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