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Garagem: lugar de disputa

Por Cidades e Serviços
Última atualização: 11/09/2013
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É inegável: brasileiros são apaixonados por carros. Somente no ano passado, foram vendidos mais de 3,8 milhões de automóveis, recorde de venda que representa um crescimento de 4,6% em relação ao ano de 2011. Essa paixão talvez explique porque a garagem é um dos espaços mais problemáticos de administrar em um condomínio. Foco constante de conflitos entre moradores, a disputa por vagas pode comprometer a paz da coletividade e deixar marcas no bem-estar da unidade.

A legislação urbanística atual exige que o condomínio seja construído com a quantidade de vagas equivalente ao número de unidades, levando em conta a rua, o bairro e o número de quartos do imóvel. Segundo André Luiz Junqueira, supervisor jurídico da Schneider Associados, a orientação vem sendo cumprida, e os prédios recém-erigidos já contam com uma garagem mais equânime. “Aqueles que não respeitam, seja por erro de projeto ou outro motivo qualquer, terminam tendo problemas com o ‘Habite-se’”, ressalta o advogado.

O Alvorada, condomínio na Tijuca, segue o novo padrão. Cada uma das 20 unidades tem direito a um espaço delimitado na garagem do prédio. A localização das vagas também foi estipulada pela convenção. “Todas as vagas são numeradas e cada uma delas pertence a uma unidade. Por conta disso, nunca houve problema decorrente de disputa pela garagem. Quando um novo inquilino ou proprietário chega, já sabe a qual vaga seu apartamento tem direito”, sublinha Patrícia Tavares da Silva, síndica do Alvorada.

Na opinião da gestora, que já enfrentou problemas com vagas de garagem em outros condomínios, esse sistema é o ideal. “Em prédios sem vaga cativa, sempre há pessoas que acham que, por residirem há mais tempo, têm direito adquirido sobre o espaço, se comportam como donas da vaga e querem colocar o carro todo dia no mesmo lugar. No fim das contas, essa postura gera conflitos com outros condôminos. Por isso, creio que é importante a convenção estabelecer qual vaga será ocupada pelos automóveis das unidades”, observa.

Os condomínios mais antigos, entretanto, não estão adequados à nova lei. Muitos foram construídos com garagens que comportam um número inferior de carros se comparado ao de unidades. Em outros tantos, a localização das vagas não é pré-estabelecida em convenção. Nesses cenários, o que se vê são irregularidades das mais diversas naturezas: condômino que para o veículo em vaga que não lhe pertence, estaciona fora dos limites da vaga, deixa objetos nas demarcações ou obstrui com seu carro a circulação de veículos na garagem.

André Luiz Junqueira lembra que, para enfrentar essa realidade, o síndico precisa estar em dia com seus conhecimentos jurídicos e buscar na lei a resolução do conflito. “A principal lei é a de nº 10.406, do Código Civil Brasileiro, mas é preciso cautela, pois há diversas normas locais que regulam alguns assuntos em garagens de prédios residenciais e não residenciais”, afirma.

Um segundo passo é verificar as deliberações sobre garagens e vagas presentes na convenção e no regimento interno do condomínio. “Deve-se avaliar cada tipo de infração individualmente. Se não estiver contemplada nas leis internas do condomínio, o síndico pode criar novas regras, em assembleia, respeitando o quorum mínimo de 2/3 de condôminos para sua aprovação”, esclarece o supervisor jurídico da Schneider Associados.

Rodízio na garagem
Quando as vagas de garagem não são fixas, ou seja, quando os proprietários não possuem direito adquirido a uma demarcação de vaga, é comum o condomínio adotar o sistema rotativo que distribui a garagem para os moradores em um sorteio anual, realizado durante assembleia. A opção pelo rodízio acontece sempre que se entende que todos os condôminos têm direito às vagas mais bem localizadas e que, para isso, deve haver alternância na ocupação dos espaços.

Na garagem do Cidade Jardim, com 36 unidades na Tijuca, há toda sorte de vagas: cobertas, descobertas, grandes, pequenas, livres e presas por outras. Nivaldo da Fonseca Pinto, síndico à frente do condomínio há dois anos, admite que algumas demarcações possuem localização mais privilegiada e, para não causar ciúmes entre vizinhos, pratica o sorteio anual de vagas. Todos podem participar, inclusive os condôminos que, porventura, não comparecerem à assembleia do sorteio. “Em qualquer assembleia, o condômino ausente pode ser representado por alguém munido de procuração. Contudo, no caso de sorteio das vagas, a gente aceita o comunicado verbal de que ele será representado por outro condômino. Caso não indique alguém, ao final do sorteio, as vagas restantes são distribuídas pelos faltosos em primeiro lugar, e inadimplentes, caso existam, por fim”, declara.

Para ser válido, o sorteio, entretanto, precisa apresentar regras claras e bem específicas, previamente estipuladas pelo próprio condomínio e que sempre respeitem os direitos adquiridos e os limites do bom senso. Depois de definido, esse conjunto de normas deve gerar um documento escrito e ser aprovado em assembleia. Somente após esses trâmites legais, é que o sorteio poderá ser efetuado. Caso não siga as orientações, o síndico corre o risco de ver o sorteio de vagas de seu condomínio ser protestado e questionado por um ou mais condôminos descontentes.

Nivaldo seguiu o recomendado e, hoje, comemora a ausência de atribulações ligadas às vagas da garagem do Cidade Jardim. “O sistema de rodízio evita que alguém seja prejudicado com a posse definitiva de uma vaga descoberta ou presa por outro veículo. Como todos aqui participam do sorteio, não temos problemas. Curiosamente, a assembleia do rodízio é a mais concorrida e conta com praticamente todos os condôminos”, enfatiza o síndico que permite, ainda, que os condôminos, de comum acordo, troquem entre si as vagas logo após o sorteio.

A garagem de Marcos Romero, por sua vez, nem sempre foi tão tranquila quanto a de Nivaldo. O síndico do Santa Ignez, com 17 unidades, também na Tijuca, conta que o gestor anterior tentou remanejar uma vaga, e o filho da condômina afetada interveio na situação de forma agressiva, pois a mãe não queria trocar de lugar. “O problema aqui é que o nosso regulamento permite ao síndico remanejar as vagas quando for necessário. A gente sempre usa o bom senso, mas as pessoas acham que estão sendo desprestigiadas de alguma forma. Resta-nos então explicar detalhadamente o que motivou a nossa decisão. Por isso, procuro debater minhas decisões em assembleias extraordinárias ou, quando o caso é urgente, envio comunicados”, pontua Marcos Romero.

Venda e locação de vagas
O condomínio, no geral, comporta diferentes realidades que variam de acordo com as unidades. É comum, por exemplo, uma mesma família possuir mais de um carro. Da mesma forma, há aqueles condôminos que preferem motocicletas a automóveis e, ainda, os proprietários de imóvel que simplesmente não possuem carros. Como proceder então nesses casos?

Segundo o advogado André Luiz Junqueira, a ocupação de vagas por motocicletas, por exemplo, vai depender das regras estabelecidas pelo regimento interno. “Depende da regulamentação do condomínio, mas, a princípio, vagas podem ser ocupadas por carros ou motos, desde que se respeite o limite físico do espaço ou eventual limite de veículos por vaga”.

Já aqueles condôminos que não são donos de veículos podem vender ou alugar a sua vaga de direito, desde que para pessoas que residam no condomínio. “A venda deve ser realizada por escrito, via escritura pública, e registrada no Cartório de Registro de Imóveis. Na hipótese de a vaga não ser escriturada por algum motivo, de qualquer forma, sua venda deve ser realizada por escrito, e o condomínio tem de ser informado. Já nos casos das locações, se a vaga é exclusiva, ou seja, de propriedade do condômino, ele pode locar para quem ele desejar, desde que residente. O condomínio não pode proibir nesse caso, salvo se as vagas forem comuns”, ressalta.

A lei 12.607/12 é a norma federal que legisla sobre o tema e, ao proibir o aluguel e a venda de vagas de garagem, objetiva garantir a segurança do condomínio, reduzindo o número de pessoas estranhas que transitam em suas áreas comuns.

Como se vê, há quantidade razoável de leis específicas que abordam a situação das garagens condominiais. Para a síndica Patrícia Tavares da Silva, que também é advogada, a existência de legislação não é o suficiente para frear os debates ocorridos em torno desses espaços. “É claro que é importante haver normas que sinalizem como deve ser a utilização das garagens, mas elas não impedem o surgimento de conflitos. Em se tratando desses espaços, o imprescindível, mais do que vagas ou leis, é o bom senso. E cabe ao síndico fazer prevalecer esse bom senso entre os condôminos”, destaca.

Se não souber como fazer valer o respeito e as regras nesses espaços, o gestor condominial pode recorrer à ajuda profissional. “As garagens causam tantos problemas porque são a expressão máxima do que é o condomínio: compartilhamento de espaço. A legislação pode ser melhorada, mas a causa principal dos problemas está no fato de os condôminos sempre desejarem um pouco além do seu direito. Em caso de dúvidas, o síndico deve consultar um advogado para que seja avaliada qual a situação jurídica atual das vagas, evitando, assim, que direitos adquiridos sejam desrespeitados. Vale também consultar um engenheiro para que sejam avaliadas eventuais opções de demarcações que não desrespeitem as normas urbanísticas locais. O síndico deve ter em mente que a melhor solução é sempre a que resulta de uma cuidadosa avaliação e discussão amigável”, finaliza.

 

Texto: Aline Duraes

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